A formação de um jogador de futebol é um processo amplo, complexo e delicado. Muitos fatores podem ser determinantes para que a trajetória de um atleta em um clube possa ser bem ou mal sucedida, desde o ingresso dele na agremiação até a promoção ao time principal.
A estrutura e, por consequente, divisão das crianças e jovens nas categorias de base acontece, prioritariamente, pelo ano corrente de nascimento dos atletas – ou seja: todos aqueles de nasceram no ano de 2022 comporão a mesma categoria no futuro, por exemplo. Desta maneira, um menino ou menina que nasce em janeiro competirá com outro de dezembro. Situação essa que pode gerar um desequilíbrio formativo, competitivo e avaliativo.
Algumas federações e clubes adotam um calendário etário ainda mais amplo, de dois anos, neste caso, a diferença se torna ainda maior: o jogador que nasceu em janeiro de 2021 participará da mesma categoria de alguém que nasce em dezembro de 2022, gerando uma diferença de praticamente 23 meses entre um e outro.
Além disso, existem as diferenças maturacionais que ocorrem durante os períodos pré-púbere, púbere e pós-púbere. As diferenças de crescimento físico, hormonal e mental influenciam diretamente no desenvolvimento individual e coletivo dos jogadores. Por exemplo: dois atletas podem ter 14 anos, jogar na mesma categoria, e possuírem velocidades de crescimento completamente distintas.
Essas evidências nos fazem refletir e ter um olhar ainda mais atento e minucioso à estruturação das diferentes equipes e categorias pertencentes às divisões de base nos clubes. Porém, o trabalho deve ser executado e as passagens / transições de categorias igualmente. Aí vem a questão: de que forma podemos formular critérios e minimizar os erros nestes momentos?
Em primeiro lugar, o clube deve ter objetivos bem claros e uma metodologia condizente com os propósitos formativos da respectiva fase de desenvolvimento do jogador. É fundamental que se defina o perfil do atleta, bem como se estabeleçam parâmetros avaliativos, muitas vezes, levando em consideração sua evolução diante deste contexto e, principalmente, o potencial (técnico, tático, físico, atitudinal…) que este tem de atingir de acordo com a etapa onde está inserido.
Quanto mais inicial for a categoria, mais complexa e delicada é esta avaliação, e melhores devem ser os estímulos técnicos, táticos individuais e psicomotores. Nas categorias Sub-9 ao Sub-12, por exemplo, as transições dos jogadores devem ser balizadas em critérios relacionados à absorção dos conteúdos, compreensão da relação com a bola (técnica aplicada ao jogo) e, principalmente, à reserva de evolução. Pois, em algumas situações a criança entende o que precisa ser feito, tenta executar, porém, fisicamente não suporta as demandas da ação e do jogo.
Confira outros conteúdos FootHub:
Uma base para a Base, por Felipe Kssesinski.
Existe uma fórmula de sucesso para formar jogadores?, por Caio Derosso.
Nas idades referentes ao final da iniciação, e começo da fase de desenvolvimento que, compreende as categorias Sub-13, Sub-14, Sub-15, Sub-16 e Sub-17, o desafio é ainda maior, agora por questões relacionadas essencialmente às diferenças físicas, diferentes velocidades de crescimento e oscilações comportamentais (já que estamos tratando da pré-adolescência e adolescência propriamente dita). Quem convive / conviveu com pessoas desta faixa etária ou viveu esta fase, sabe do desafio que é a convivência e compreensão de suas peculiaridades.
Algumas observações são fundamentais ao abordar esta etapa:
– Meninos e meninas possuem velocidades de amadurecimento físico e emocional diferentes. As meninas geralmente são mais precoces, tanto que em alguns países é muito normal ver categorias onde existem jogadores de ambos os gêneros atuando na mesma equipe até os 13, 14 anos de idade.
– Dependendo da velocidade de crescimento, na chamada “fase do estirão” na adolescência o jovem pode apresentar problemas motores e técnicos que diminuirão momentaneamente o acerto de alguns movimentos e ações de jogo, pois, as distâncias articulares tornam-se completamente diferentes.
Na etapa final da formação de base, geralmente dos 18 aos 20 (categoria juniores) os jogadores apresentam, em sua grande maioria, capacidades físicas, técnicas, táticas e atitudinais suficientes para atenderem as demandas de jogo. Porém, engana-se quem acredita que tudo acaba nesta fase. Existem sim, casos excepcionais onde os atletas são promovidos e, mesmo estando na equipe profissional, devem ter um acompanhamento especial com o “olhar atento” às situações peculiares para que o atleta “precoce” não saia do foco e perca rendimento no time de cima.
Porém, de regra, há um processo muito particular que é o “salto” da categoria de base para a equipe profissional. E, neste momento, o clube precisa saber o que realmente deseja com esses jogadores – partindo da premissa de que houve uma série de critérios e padrões de desenvolvimento para a sua chegada até esta etapa -, é fundamental ter a paciência necessária com seus jogadores, uma vez que, um passo errado pode acabar com um ativo da agremiação e fazer com que o objetivo principal (depois de anos de caminhada): que é a promoção de um atleta.
Uma das alternativas mais seguras para que os erros sejam minimizados e, este processo de transição seja bem sucedido, é a implementação de uma categoria específica para este período, onde as rotinas são similares à equipe principal, como a Sub-23 ou Aspirantes, pois além de aumentar o repertório geral de jogo, das vivências e contribuir para o aproveitamento do jogador, também é um espaço para a captação de atletas com desenvolvimento e participação em categorias de base tardiamente onde ainda há espaço de aprendizado e refino das capacidades gerais do jogador.
O processo de formação e promoção à equipe profissional é longo, árduo, cheio de detalhes, é um trabalho quase “artesanal”. Parâmetros metodológicos, coesão entre os profissionais das diferentes áreas e do treinamento em si, alinhados à clareza dos objetivos definidos pelos gestores do clube são essenciais para que estas transições – desde a passagem do Sub-9 para Sub-10, até a do Sub-20, Sub-23 ao profissional -, sejam bem executadas. Assim, clube, profissionais, atletas, gestores e, é claro, o nosso futebol se tornarão cada vez mais vitoriosos e superavitários.
Texto de Wilson Souza.