Quando um jogador se lesiona e fica afastado de treinos e jogos, qual o primeiro passo a dar? Certamente não vamos entrar na área da fisioterapia, mas sim, da neurociência esportiva. Independente dos procedimentos ortopédicos, existe uma lacuna que não se vê (ainda) no futebol, mas que em breve este conhecimento estará à disposição.
O jogador, sempre que possível, deve observar os treinos da sua própria equipe. E por que isto? Irá recuperá-lo mais rápido? A resposta é que não irá agilizar a recuperação, mas irá fazer com que a perda de desempenho (sobretudo do ponto de vista físico-técnico-tático) não seja tão acentuada, podendo até manter e elevar seus índices de conhecimentos declarativo e processual.
Isto se justifica pelo fato de que o treino de alto rendimento não é feito para grandes avanços pois o nível competitivo já é extremamente elevado. O treino de alto rendimento é fundamentalmente para ajustar e melhorar detalhes tão pequenos que podem surtir diferença no momento de competição.
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Esta tentativa de manutenção/aumento da performance se deve ao que se chama de células-espelho, encontradas no córtex pré-motor. Detalhando um pouco, o córtex pré-motor seleciona os músculos e articulações para um determinado movimento, enquanto que o córtex motor envia os sinais elétricos para estes músculos e articulações selecionados previamente.
Em uma analogia, é como se o córtex pré-motor fosse a empresa de correio e o carteiro seria o córtex motor. Já as células-espelho têm a função de captar a realidade à volta do indivíduo e lançar um estímulo semelhante ao visualizado.
Se sabe, cientificamente, que o simples fato de se observar um outro alguém fazer uma flexão de braço, por exemplo, já provoca micro-ativações nos Órgãos Tendinosos de Golgi (estruturas presentes nas junções de músculo e tendão, responsáveis por gerar tensão muscular) na mesma articulação. Isto porque o nosso cérebro não consegue distinguir a imagem da realidade.
Prova disto é o fato de entrarmos em estado de alerta (adrenalina) por simplesmente assistirmos um filme de suspense, por exemplo. É apenas imagem, todos sabemos. Mas esta descarga está relacionada ao fato de que o cérebro, ao assistir algo com atenção, toma isso como uma vivência, e não como algo alheio.
Sendo assim, podemos dizer que a observação do treino pelo jogador lesionado pode, sim, trazer benefícios para o mesmo uma vez que a sua atenção estiver voltada para movimentos individuais e coletivos de companheiros de equipe. O cérebro, como vimos anteriormente, irá encarar aquela imagem como uma vivência e pequenas ativações neuromusculares irão ser desencadeadas para todo o corpo do atleta.
Obviamente que o conhecimento deste jogador pode ainda ser potencializado uma vez que haja debate em relação aos exercícios feitos e as decisões tomadas no treino. De qualquer maneira, fisiologicamente já se tem mais um fator que pode contribuir para a manutenção ou melhora do desempenho.
Texto de Leonardo Monteiro.