O(a) treinador(a) constrói a sua cultura de jogo em cima das suas convicções e valores e da sua visão do jogo. Enquanto a equipe estiver “comprando” a sua ideia, ela vai representá-lo(a) bem sobre o campo de jogo. Vai demonstrar princípios que retratam como o(a) treinador(a) vê o jogo, como se relaciona com ele e com tudo que o cerca.
Quando não existe sincronia entre a escola de futebol do clube, que geralmente foi moldada por anos de existência, e a cultura de jogo do(a) treinador(a), a possibilidade de insucesso é grande.
Alguns clubes sempre foram identificados ao longo de sua história por apresentarem equipes propositivas. Dificilmente um(a) treinador(a) com uma cultura, em que se inclui um modelo de jogo reativo, vai se dar bem neste contexto. O inverso também é verdadeiro.
Equipes “pilhadas” por seus treinadores vão a campo com o sangue nos olhos. Outras, por sua vez, são conscientes da sua qualidade técnica e, apoiadas por um comando sereno, fazem da vitória um resultado natural.
Telê Santana sempre buscou aliar a vitória à estética!
Valorizava a cultura do jogar limpo e bonito. Frequentemente suas equipes agraciavam seus torcedores com partidas memoráveis, jamais esquecidas. Faziam da técnica individual a protagonista do espetáculo.
Outros treinadores priorizam o resultado. Nada de errado com o conceito cultural que faz do resultado o único propósito, ficando o entretenimento em segundo plano. Entretanto, seu impacto na memória não é perene. Como disse Jorge Valdano:
“Quando se joga bem futebol, a fúria recupera o lugar secundário que lhe corresponde.”
A mentalidade de resultado fez com que o futebol brasileiro, de uma forma geral, estivesse inserido num contexto em que predomina o baixo risco. E como se diz no mercado financeiro, se o risco é baixo, o retorno também é baixo. Assim, sem que se corra riscos, o espetáculo perde em beleza e, dificilmente, a estética acompanha a vitória.
De um modo geral, em favor dos(as) treinadores(as) podem-se considerar a densidade competitiva abusiva e a intolerância sem limites das torcidas. Uma lhes tira a condição de melhor preparar as suas equipes. A outra, a tranquilidade e a de seus comandados de exercerem o seu trabalho com naturalidade.
Leia também no site do FootHub:
Para cada realidade, uma verdade, por Fernando Carvalho
Neste sentido, o trabalho em seleções desenvolve-se num contexto bem diferente. Se, por um lado, conta-se com uma qualidade técnica excepcional, por outro, o tempo de preparação é curto e, muitas vezes, recheado de compromissos institucionais e outras distrações. Não se esquecendo da interminável briga para a liberação dos jogadores junto aos grandes clubes europeus.
Observe-se que a conturbada relação com a torcida não chega ao extremismo, como é caso vivenciado pelos clubes.
Em relação à Seleção Brasileira, fica claro que a construção de uma cultura de jogo sólida está muito bem implantada. Pode-se discordar da ideia de jogo, mas não tem como não perceber que todos os envolvidos no processo “bebem de um mesmo cálice”, “falam uma mesma língua.”
O Tite sempre teve a grande virtude de deixar bem claro o que espera dos seus atletas. Como sabemos, os jogadores estão em constante comunicação entre si e, quando chegam à Seleção Brasileira, já sabem como “a banda toca”. Enquanto comandava clubes, também era visível a linha mestra traçada pelo atual treinador da Seleção Canarinho. Equipes solidárias, conjuntos sólidos, times equilibrados. Jogadores conscientes das suas responsabilidades dentro e fora do campo.
O atual treinador da Seleção Brasileira sempre foi dono de uma autoridade pessoal ímpar. A meritocracia sempre fez parte da sua tomada de decisão e os jogadores sabem disso muito bem.
Por fim, as inúmeras vitórias fazem dele um líder cada vez mais respeitado. Respeitado, sempre. Admirado, frequentemente. Contestado, às vezes. Pode-se não gostar do seu estilo pessoal ou do seu modelo de jogo, mas deve-se conceder a ele o mérito de ter implantado ao longo dos últimos 6 anos uma cultura de jogo muito bem definida à frente da Seleção Pentacampeã Mundial.
Se será campeã, não sabemos.
Texto de Geraldo Delamore