Me permito começar o texto com algumas perguntas:
- Por que o Futsal nunca fez parte do programa dos Jogos Olímpicos de verão?
- Por que um dos esportes mais praticados no mundo e com uma curva de crescimento tão alta, não consegue ser uma modalidade olímpica estabelecida?
- Por que os outros esportes coletivos de quadra e outros esportes emergentes, tem levado vantagem sobre o Futsal?
- Por que o Futsal não tem representatividade junto ao COI (Comitê Olímpico Internacional)?
O conteúdo a seguir foi desenvolvido no intuído de nortear uma discussão que sempre vem à tona durante a realização dos Jogos Olímpicos – Futsal e Olímpiadas. Não tenho a intenção de polemizar, culpar pessoas e instituições citadas abaixo. No entanto, precisamos pensar sobre o que aconteceu e acontece até hoje, não omitindo A ou B.
Carecemos ser mais flexíveis ou aceitar o posicionamento do COI, sejam quais forem as razões por trás da exclusão da modalidade nas Olimpíadas até o momento. No entanto, cada um de nós possui a liberdade de concordar ou discordar dessa decisão.
Histórico – Cultural
Tentando explicar os porquês da temática, me permito voltar ao tempo e contextualizar.
A modalidade Futebol de Salão/Futsal é praticada desde os anos 40, fazendo-se oficializada em 1954. Avançando na linha temporal, saltamos para a sua organização no contexto mundial, onde podemos dizer que houveram momentos confusos e conturbados em toda sua trajetória como modalidade constituída.
Entre 1971 e 1989, o antigo Futebol de Salão era organizado pela FIFUSA (Federação Internacional de Futebol de Salão). Com a entrada da FIFA (Federação Internacional de Futebol) em 1989, a FIFUSA perdeu força e passou a ser renegada a segundo plano, gerando mais problemas organizacionais e de visibilidade.
Em 1990 membros da FIFUSA não aceitaram a imposição da FIFA para que se filiassem, surgindo uma nova entidade internacional de Futsal – PANAFUTSAL (Confederação Pan-americana de Futebol de Salão). Supõe-se inclusive que se o Futsal não tivesse sido absorvido pela FIFA, já teria se tornado um esporte Olímpico.
No início dos anos 2000, a nomenclatura Futebol de Salão e diversas regras foram alteradas, na tentativa de modernização e divulgação da modalidade, passando-se a se chamar – Futsal. Nesse mesmo instante a modalidade deixa se ser caracterizada pelo adjetivo de “esporte da bola pesada”.
Devido as divergências, em 2022 há FIFUSA deixa de existir. No mesmo ano, membros da PANAFUTSAL ou CPFS (Confederação Pan-americana de Futebol de Salão) criam a AMF (Associação Mundial de Futsal), para seguir o legado da FIFUSA, no propósito de organizar sua própria Copa do Mundo e outras competições sem a “bandeira” da FIFA.
Dizem os mais antigos, que essa “briga” política e decorrente separação, foi o start para os problemas que carregamos até hoje da não inclusão do Futsal nas Olímpiadas. Considero que algumas das nossas principais instituições de Futebol/Futsal na América do Sul também tem parcela de autoria nas escusas, em virtude da conveniência com a situação ao passar dos anos, entre as quais: CONMEBOL (Confederação Sul-americana de Futebol), CBFS (Confederação Brasileira de Futsal), e CBF (Confederação Brasileira de Futebol), atual responsável pelas seleções nacionais masculina e feminina.
Uma condição importante conquistada em 2021, é a CBF ter absorvido as seleções nacionais, já que a mesma tem ligação direta com a FIFA, abrindo-se possibilidades de conversas se vontade tiver. O mesmo digo em relação as outras Confederações e Associações Internacionais, que há tempos mantém o Futsal em seu “guarda-chuva” organizacional (AFA – Associação de Futebol Argentino, RFEF – Real Federação Espanhola de Futebol, FFF – Federação Francesa de Futebol, FPF – Federação Portuguesa de Futebol, outras), posto isso, se bem organizado, poderíamos aumentar consideravelmente a nossa força por um Futsal Olímpico.
Tradicionalmente, é possível afirmar que perdura uma falta de clareza na rejeição do Futsal como modalidade Olímpica. Pouco sabemos sobre as verdadeiras origens que insistem em deixar de fora o Futsal, aliás, praticamente todo simpatizante, ou profissional do esporte, já discutiu e emitiu opinião sobre esse assunto.
Existem inúmeras versões sobre tais causas, logo, vou me empenhar da melhor forma possível para resumir as principais questões que podem ter afastado o Futsal do programa Olímpico de verão.
É adequado salientar outra vez, que até hoje não temos uma resposta convincente e oficial, ou seja, tudo é extraoficial, baseando-se nos conceitos históricos – culturais – políticos da modalidade Futsal e instituições esportivas implicadas.
Motivos pelo qual o futsal não faz parte dos Jogos Olímpicos (não oficiais)
1.
A “eterna” possível desavença entre o COI e a FIFA. Neste embate, O COI teria a intenção de liberar as idades para o Futebol masculino, não tendo mais a obrigatoriedade de idade limite – 23 anos, excluindo igualmente a necessidade de inscrição dos três jogadores acima da idade permito no regulamento vigente.
Na verdade, o COI tem o sonho que as equipes principais participem, com a totalidade dos seus ídolos maiores em campo. Já a FIFA não concordaria com este pedido, visto que os Jogos Olímpicos se tornariam uma segunda “Copa do Mundo”, concorrendo com o evento organizado por eles. Em resumo, teríamos na visão da FIFA, duas “Copas do Mundo de Futebol”, de dois em dois anos, o que seria capaz de prejudicar o seu negócio como um produto não mais exclusivo.
Ponto de vista: Pode até ser a versão mais aceitável, fazendo certo sentido. Existe muita política, vaidade e jogo de preferências exclusas. Percebo que não há a menor vontade de se sentarem à mesa, para resolverem a situação. É o famoso jogo do poder que ninguém está disposto a ceder!
2.
Seguindo a mesma linha de raciocínio do item 1, há quem diga que o Futsal nos Jogos, atrapalharia o mundial de Futsal organizado pela FIFA, dado que acontece no mesmo ano dos jogos, gerando mais um conflito de interesses. Seria uma Copa do Mundo de Futsal e as Olímpiadas no mesmo ano.
Ponto de vista: Mesma linha de raciocínio do ponto de vista 1. Se houvessem boas intenções e força política, dar-se um jeito para readequação do calendário do Futsal, além de outras possibilidades.
3.
Outra especulação, seria o pouco progresso do Futsal feminino pelo mundo, situação essa que já mudou faz tempo, inclusive com a realização da sua primeira Copa do Mundo FIFA programada para 2025, e outras competições.
Ponto de vista: Acho pouco provável ser matéria para a não inclusão. O Futsal feminino ainda carece de evolução, porém, já é amplamente desenvolvido em dezenas de países, tanto na fomentação como no alto rendimento, nos mostrando diversas competições nacionais e internacionais em todos os continentes.
4.
No passado muitos países não tinham uma liga forte ou seleções ativas. Hoje, posso afirmar que mais de 180 nações praticam o Futsal competitivo e informal. Todas a 06 entidades Federações, Confederações, Associações filiadas a FIFA espalhadas pelo mundo, organizam as suas competições de Futsal direcionadas aos clubes e seleções.
Ponto de vista: O Futsal atual é uma modalidade consolidada de abrangência mundial em todos os aspectos esportivos. Em outros tempos realmente já foi uma modalidade muito regionalizada, hoje não acredito nessa possibilidade.
Obs.: Segundo os critérios da Carta Olímpica do COI, para se tornar um esporte Olímpico, é imprescindível que a modalidade seja reconhecida pelo Comitê, regida por uma Federação Internacional, e seguir o código antidoping do COI. (estamos contemplados!)
O documento diz em sua composição que ela precisa ser amplamente praticada por homens em pelo menos 75 países e quatro continentes. (estamos comtemplados!)
O Futsal cumpre os requisitos indicados pelo COI e é um dos esportes formais e informais mais praticados no mundo, prova disso é a estabilidade das principais competições internacionais nos mesmos moldes de organização direcionadas ao Futebol:
- Copa do Mundo FIFA (seleções);
- Eliminatórias (todas as Confederações Internacionais de Futebol) (seleções);
- Futsal Euro UEFA (seleções);
- Finalíssima Futsal UEFA x CONMEBOL (seleções);
- Copa América CONMEBOL (seleções);
- Copa Libertadores CONMEBOL (clubes);
- Champions League UEFA (clubes); e
- Outros torneios e competições organizados pelas Confederações internacionais de Futebol com chancela FIFA (clubes e seleções).
5.
O episódio de países chaves/potências olímpicas como Estados Unidos, China, França, Inglaterra, Coreia, Alemanha, outros, não darem importância para o Futsal em seus programas/Comitês Olímpicos, já serviria de especulação para a não entrada da modalidade (falta de apoio).
Ponto de vista: Existiria uma dificuldade natural na conquista desses países por medalhas (Futsal), por isso acredito nessa perspectiva. As forças olímpicas ainda não têm seleções do mesmo nível de países mais célebres. Nesse cenário o Brasil teria grandes possibilidades de se tornar medalhista olímpico.
6.
Um outro aspecto que poderia prejudicar a inclusão do Futsal, é a presença do Futebol como Esporte Olímpico. Pressupõe-se que para o COI, não seria de bom tom dois esportes semelhantes no programa.
Ponto de vista: Novamente uma justificativa sem base. É importante lembrar que, assim como há vôlei e vôlei de praia, natação e nado sincronizado, ciclismo de estrada, de montanha e de pista, surge a pergunta: Não seriam capazes de coexistir Futebol e Futsal? Talvez consiga ser explicado pela limitação do número de modalidades. Portanto, a realidade é que, para incluir uma modalidade, é necessário retirar outra do programa olímpico.
7.
Vale ressaltar, que nada impede que possa ter sido oferecido ao COI uma proposta da FIFA para tratar desse assunto por pura conveniência unilateral: o Futsal substituiria o Futebol nos Jogos Olímpicos.
Ponto de vista: Mesmo sendo uma especulação, será que o COI concordaria em retirar o esporte mais popular do planeta dos Jogos Olímpicos? Penso que não.
8.
Por ciúme o COI não englobaria o Futsal, por temer o aumento da relevância de mais um esporte organizado pela FIFA. Lembrando que o Beach Soccer faz parte do sistema FIFA e não faz parte dos jogos.
Ponto de vista: Não acredito nessa hipótese. Seria algo muito fora da curva. Continuo com a opinião que se trata de um jogo de vaidades e interesses entre as duas instituições e potencias esportivas/países sem interesse (braço de ferro).
É nítido que não podemos ficar presos unicamente aos 08 itens acima citados. Podem existir diversos outros motivos, considerações e argumentações tão cabíveis quanto.
Considerações
O sentido principal do texto é avaliar o assunto e divulga-lo, para que enfim entendamos que não estamos vencendo essa batalha. Levantar a bandeira durante a realização dos Jogos Olímpicos é insuficiente, isto significa, iniciar uma campanha apenas no mês da competição que acontece de quatro em quatro anos.
Desse jeito, jamais vamos conseguir inserir o Futsal no programa, estamos usando uma estratégia errada! Precisamos de uma boa campanha, disposição, pró atividade, política, organização – pessoas com poder de decisão interessadas! A propósito, os interessados e não interessados em algum instante precisam se reunir e dialogar com a maturidade que se exige, deixando de lado os interesses políticos e vaidades.
Gostaria de deixar registrado como exemplo de boas práticas, o feito realizado pela FPFS (Federação Paulista de Futsal) entre 2003-2006. A Federação liderou uma extensa campanha intitulada “Futsal – Um sonho olímpico”, objetivando a inclusão do Futsal nos Jogos Olímpicos de Londres 2012, que aliás não se concretizou.
Esse movimento, muito bem organizado, recebeu apoio de muita gente importante e permaneceu por 03 – 04 anos tentando incluir o Futsal nas Olímpiadas. Lembro, que muitas personalidades do mundo dos esportes, organizações governamentais, Federações, Confederações, Associações nacionais e internacionais, participaram dessa iniciativa. Talvez tenha sido até hoje, o movimento mais duradouro e organizado em prol do Futsal Olímpico.
De forma extraoficial, referenciam que esse movimento ajudou bastante na posterior inclusão do Futsal no programa dos Jogos Pan-americanos realizado no Rio de Janeiro em 2007, onde o Brasil ganhou a medalha de ouro, portanto, não podemos dizer que foi perda de tempo. Infelizmente essa foi a primeira e única participação do Futsal nos jogos Pan-americanos.
Mantendo a infinita “saga”, depois de um hiato considerável, apenas em 2018, tivemos a grata surpresa do Futsal sendo introduzido nos Jogos Olímpicos da Juventude realizado em Buenos Aires na Argentina, onde mais uma vez ficamos com o lugar mais alto do pódio.
Essa incorporação, mais uma vez nos trouxe expectativas, contudo, para variar, não fomos inseridos no programa de Tóquio 2020 e Jogos Olímpicos da Juventude subsequentes. A não participação do Futsal em competições sob a supervisão ou organização direta do COI se perpetua até hoje, sem perspectiva positiva para os próximos anos.
Nessa época da campanha, é interessante frisar que o Futsal de seleções não estava sob os cuidados da CBF, porém, outros países já o tinham agregado as suas Confederações. Pondero, que isto nunca poderia ter sido um fator impeditivo para justificar a distância cultivada perante ao COI de forma geral. Voltando nosso olhar para o Brasil, a CBF é agora a responsável direta por cobrar a FIFA, que consequentemente precisa “apertar” o COI. Essa operação deve ser repetida por todas as outras 05 Confederações internacionais, unindo as energias.
Mas, por que manter a determinação de se tornar uma modalidade olímpica? Até que ponto vale essa “briga”? Quais os benefícios?
Pois bem, respondo com outras duas perguntas. Qual esporte ou esportista não quer fazer parte desta ocasião única? Por que não tentar?
A participação nos traz muito mais do que podemos enxergar. Talvez o torcedor, ou a pessoa mais desinformada não tenha a real consciência da importância de se fazer presente em um programa olímpico.
Além do glamour e representatividade, existem outros atores importantíssimos para o crescimento e desenvolvimento da modalidade:
- Participação nos programas Olímpicos governamentais e privados (nacionais e internacionais);
- Criação de programas específicos direcionados para jovens atletas;
- Maior prestigio nacional e internacional;
- Maior fomentação mundial – formação e alto rendimento;
- Possibilidade de melhor as estruturas físicas e administrativas – fomentação e alto rendimento;
- Criação de programas específicos direcionados para jovens atletas; e outros.
Reflexão final
Temos que parar de desmerecer e comparar os outros esportes que tem conquistado espaço no programa Olímpico (Skate, Surf, Breaking, outros), deixando de vez as nossas mágoas e erros para trás. Todos os esportes carecem de respeito, diante disso também tem o legítimo direito de pleitearem as suas vagas.
É preciso renovar, e isso não contesto. Novos públicos, pessoas jovens têm atraído os olhares do COI, por isso uma variedade de esportes radicais vem ganhando espaço.
Não seria mais fácil que as pessoas a frente do Futsal, abrissem a mente para aprenderem com estes esportes. É necessário que se faça uma simples análise abstraindo qualquer conflito de pensamento, substituindo o orgulho que resiste, com perguntas inteligentes do tipo:
- Como esses esportes chegaram lá tão rapidamente e nós não?
- O nosso jogo não é atrativo para um modelo moderno de Jogos Olímpicos?
- Será que não precisamos mudar algo para se adaptar as novas realidades esportivas, como de repente as regras?
É bem possível que surjam contrapontos valiosos ao final do alto grau de empenho e questionamentos. Tanto esforço está realmente valendo a pena? Bom debate!
Independentemente de qualquer situação e prognóstico futuro, devemos urgentemente evoluir, organizar/planejar, melhorar os nossos processos, e aumentar as relações políticas. Só assim, e com um pouco mais de paciência, vamos conseguir chegar a nossa finalidade de se tornar uma modalidade olímpica (caso ainda procuremos isso).
Para encerrar deixo a seguinte mensagem…
Temos que torcer para todos os esportes olímpicos, para que um dia enfim torçam por nós!
Texto de Rodrigo Neves
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