Nos últimos dias estava organizando os pensamentos para o tema da reflexão desta semana quando leio a seguinte mensagem em um grupo de um curso de Gestão do Futebol: “Recebi esse texto hoje de um amigo executivo. Achei interessante, mas onde está o futebol?”
Confesso que fiquei com essa pergunta na cabeça durante algumas horas.
O texto referido na mensagem é a tradução do anuário que a revista The Economist publicou a respeito de 2021 e que foi divulgado em alguns sites, compartilhado em grupos de whatsapp e perfis de redes sociais como do Diretor Geral da Michael Page, Ricardo Basaglia (os textos podem ser encontrados nos destaques do Instagram dele), e do CEO do Experience Club, Ricardo Natale. No anuário, a The Economist apresenta 20 pontos analisados por 50 especialistas. Não entrarei nos detalhes de todos os temas, mas de forma resumida eles abordam:
- Socialização e trabalho;
- Assistentes digitais
- Vida e trabalho digital
- Casas mais tecnológicas
- Pessoas realmente globalizadas
- Assinaturas de serviços on-line
- Empresas mais tecnológicas
- Turismo
- Proteção dos Dados
- Desemprego
- Educação
- Telemedicina
- Consumo mais consciente
- E-commerce
- Mudança Climática
- Notícias reais
- Saúde mental
- Soluções para problemas coletivos
- Natural e saudável
- Recomeço
E onde está o futebol?
Nominalmente o futebol e os esportes não aparecem nos 20 tópicos listados, porém a resposta para mim é simples: O futebol está em tudo!
O principal esporte brasileiro é uma indústria que movimenta mais de 50 bilhões de reais por ano na economia, representando entre 0,7 e 0,75% do PIB (Produto Interno Bruto) do país. Quando analisamos essa indústria de forma global, os números são ainda mais expressivos, porém esse tema pode ser explorado em uma coluna única sobre o mundo financeiro futebolístico.
Então, como indústria, é possível constatar que o futebol está presente no anuário da The Economist por meio de ações e atividades que clubes, federações e outros stakeholders estão realizando ao longo dos últimos anos.
Seria possível comentar sobre como o futebol está atuando sobre cada item destacado pela revista. Para não ficar um texto muito grande, filtrei alguns tópicos com exemplos práticos dessas atuações.
1 – Socialização e trabalho: Para a revista “os humanos querem se socializar novamente, mas o trabalho remoto basicamente permanecerá o mesmo”. Acredito que todo clube passou durante a pandemia por esse momento com seus atletas e colaboradores. Para quem tiver interesse sobre algumas ações que pude participar nesse período difícil para todos é só clicar aqui.
Os itens 2 e 5 abordam sobre assistentes digitais que auxiliam na eficiência do trabalho e em pessoas globalizadas que não precisam estar fisicamente na sede da empresa para trabalhar. Esses dois pontos podem ser encontrados na evolução dos departamentos de Scouting/Análise de Mercado. Cada vez mais o Scouting Analytics vem evoluindo no futebol e os clubes começam a contratar analistas de mercado de modo freelance ou fixos, mas que trabalham de suas residências, longe do Centro de Treinamento ou estádio.
Ainda nessa esfera envolvendo a evolução da tecnologia, os itens 6 (assinaturas de serviço on-line) e 7 (empresas mais tecnológicas) apresentam conceitos interessantes como “tudo o que é repetitivo torna-se virtual e em regime de assinatura. De igrejas, arte, academias, cinemas, entretenimento” e “a tradicional empresa chegou ao fim em 2020. Resta esperar sua morte final”
Alguns clubes, federações e empresas esportivas já perceberam que esse é um caminho sem volta. Hoje é possível encontrar plataformas de educação voltadas ao futebol que funcionam com assinatura mensal. Federações transmitindo seus jogos em softwares como Mycujoo e Youtube, super aplicativos de clubes e ligas (aqui um parênteses interessante para destacar essa iniciativa da Liga Paulista de Futsal) e clubes transmitindo seus jogos e outros conteúdos em plataformas exclusivas como o Furacão Live (Athletico Paranaense) e Sócio Digital (Bahia).
A proteção de dados, destacada no item 9 do anuário, já é uma realidade nos clubes brasileiros, principalmente após a aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que afeta de forma direta, por exemplo, os programas de sócio torcedores e a base de dados de outros serviços como e-commerce (item 14).
O que mais gostei na publicação da The Economist foram os destaques em pontos ligados ao consumo mais consciente (item 13), mudanças climáticas (item 15) e o aumento do consumo de produtos naturais e saudáveis (item 19). Existem exemplos reais no futebol brasileiro de ações que vão encontro dessas tendências, como a horta comunitária do CAP – os atletas são os responsáveis pelo plantio e manutenção da horta e os alimentos produzidos são utilizados nas refeições do Centro de Treinamento e doados para instituições de caridade locais.
Existe também o EcoGalo, projeto de sustentabilidade do Atlético Mineiro, que conta com diversas ações como a coleta seletiva dos resíduos produzidos no centro de treinamento e a transformação desses resíduos em adubo orgânico. A Cidade do Galo, gera, por mês, cerca de 35 toneladas de resíduos e, ao invés de jogar isso em aterros sanitários, fazem a reciclagem de 100% desses resíduos na usina de triagem e compostagem, localizada dentro do CT.
Um dos exemplos mais interessantes e completos, que deve servir de inspiração para os clubes brasileiros, vem de onde surgiu o futebol. Na Inglaterra, o Liverpool lançou o “The Red Way”, uma iniciativa para um futuro baseado em três pilares para sustentabilidade.
1 – Nossa Gente: O Liverpool traz reflexões de como permitir que seus colaboradores ampliem suas habilidades e conhecimentos e transformem isso em uma agenda positiva.
Como fazem isso? Na última temporada incentivaram ações de voluntariado aos seus colaboradores. Ao todo, foram 432 horas dedicadas para ações de voluntariado. Além disso, 26 colaboradores foram treinados para serem socorristas em saúde mental (olha o item 17 presente aqui).
2 – Nossa comunidade: Através da sua Fundação, o clube inglês promoveu encontros com mais de 20 mil pessoas. Com o projeto Red Neighbours, facilitou a doação de 37,5 toneladas de alimentos para mais de 12 mil pessoas ou famílias.
3 – Nosso planeta: Como o próprio nome já diz, o Liverpool tem em seu terceiro pilar o objetivo de impactar de forma positiva o local onde vivemos. Para isso, também cultivam uma hora cujos alimentos são servidos em seu estádio nos dias de jogos, trabalham para ser um clube neutro na emissão de CO2 (já compensaram a emissão de 435 toneladas) em suas atividades, plantaram mais de 635 árvores e 6 mil plantas no novo Centro de Treinamento e são signatários da iniciativa “Esportes para Ação Climática” da Organização das Nações Unidas (ONU) que visa unificar as organizações esportivas para fazer sua parte na criação de um futuro mais sustentável, aderindo a princípios-chave sobre ação climática.
Como vocês podem ver, o Futebol está em muitos lugares, em várias tendências e em constante transformação. É nosso dever, como colaboradores (em cargos de gestão ou não) estarmos sempre ligados e dispostos para colaborar com a profissionalização e evolução do esporte.
Finalizo com a transcrição do item 20 do anuário:Recomeço –O mundo está vendo este ano como um novo começo. Um renascimento. As pessoas vão repensar seus objetivos pessoais, de trabalho, saúde, dinheiro e espirituais. Grandes oportunidades estão surgindo para satisfazer todos esses requisitos e mudanças de pensamento. Um novo começo com valores mais reais. Muitos comportamentos são transformados e nunca mais voltarão!
Texto de Caio Derosso.