Na edição 2020 do Campeonato Brasileiro de futebol masculino, apenas um terço das 27 Unidades Federativas do país estão representadas na Série A do certame. Os 20 clubes da elite pertencem atualmente a nove estados do Brasil: BA, CE, GO, MG, PE, PR, RJ, RS e SP. Se voltarmos dez anos, à edição de 2010, também vamos encontrar nove estados na disputa – e com apenas uma mudança em relação ao quadro atual: SC ao invés de PE. O mesmo cenário ocorre se consultarmos os participantes da Copa João Havelange, o Brasileirão do ano 2000. Também com nove estados representados na elite, a competição contou com um time do DF, mas não teve a participação de um catarinense.
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Como podemos observar, houve pouca rotatividade entre os estados nos últimos vinte anos de disputa da competição. Unidades Federativas com tradição, como RJ, SP, RS e MG, sempre mantém representantes na elite, enquanto estados como SC (que chegou a ter 4 equipes em 2015) e PE disputam um lugar ao sol entre os grandes do futebol. Por outro lado, existem estados que sequer chegam perto de colocar um clube na Série A do Brasileirão.
Dentro deste grupo de participantes assíduos da elite, há ainda uma espécie de monopólio na disputa pelo título e pelas vagas para a Copa Libertadores da América. O último campeão fora do eixo RJ/SP/MG foi o Athlético Paranaense, no já distante 2001. Em relação às vagas para a principal competição do continente, as oportunidades também são escassas. O Nordeste, por exemplo, embora tenha frequentemente representantes na Série A do Brasileirão, dificilmente consegue colocar uma equipe na Libertadores. A última vez que isso ocorreu, lá em 2009, foi através do título da Copa do Brasil, com o Sport.
Mas por que essa espécie de República do Café com Leite acontece no nosso futebol? Bem, talvez esse desequilíbrio possa estar apoiado no poder econômico dos estados. Assim como no futebol, o território brasileiro é centralizado economicamente em alguns centros. Um exemplo disso é que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os estados de SP, RJ, MG e RS, juntos, representaram mais de 57% do Produto Interno Bruto (PIB) do país em 2018 – a soma de todos os bens e serviços finais produzidos por um país, estado ou cidade.
Campeonato mais brasileiro
Mas como resolver isso? Antes de mais nada, é importante dizer que as equipes desses estados citados acima têm os seus méritos para chegarem onde estão. Isso não está em discussão. O que parece se fazer necessário é que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) fomente o esporte em locais com pouca ou nenhuma tradição.
Conforme a própria CBF, em 2019 a entidade registrou recorde tanto em receita quanto em investimento, com um superávit de R$ 190 milhões. Ainda de acordo com a Confederação, no mesmo ano foram investidos R$ 320 milhões na realização de competições e no desenvolvimento do futebol em todos os estados brasileiros. Porém, é importante questionar: quais foram os critérios para a destinação destes valores?
Para tentar solucionar essa questão – mesmo que de forma inicial -, acredito que os estados com menor tradição necessitem de uma atenção especial por parte da CBF, de modo que os clubes destes locais se desenvolvam gradativamente. Por exemplo: o fortalecimento dos campeonatos interestaduais, como a Copa Verde e a Copa do Nordeste, pode ser uma forma importante de reinserção destes clubes em grandes competições.
Além das vagas em torneios nacionais para os campeões, como já vem ocorrendo, a CBF poderia distribuir uma vaga para a Copa Sul-Americana, com o objetivo de inserir estes clubes em disputas continentais. Outra medida possível é aumentar a premiação para os times participantes destes torneios, com o intuito de estimular a competitividade.
Já para as categorias de base, a CBF pode implantar, a exemplo do que ocorre na Copa do Nordeste, a Copa Verde sub-20, aumentando as chances para o surgimento de novos talentos do futebol nas regiões Norte e Centro-Oeste, além do Espírito Santo. Afinal de contas, quantos atletas deixam de surgir devido à falta de oportunidades nos nossos gramados? A verdade é que ainda temos um longo caminho a percorrer até que a diversidade estadual cresça no futebol do Brasil.
Entre as possíveis soluções apontadas para a descentralização do esporte por aqui, em todas elas uma ação se faz necessária: o investimento financeiro. Portanto, é essencial que a CBF utilize parte de sua grande receita anual em favor dos clubes localizados fora dos grandes centros esportivos do país. Só assim será possível visualizar crescimento em outras praças que não as já tradicionais. O futebol, aquele verdadeiramente brasileiro, agradece.
Texto de Rodrigo Cassol.