Outro dia estava voltando para casa na linha de transporte público que geralmente me serve e uma senhorinha parecia muito irritada. Anoitecendo, a chuva chegou no ponto antes do ônibus, o que sempre é uma experiência ruim. “Se a gente botasse fogo no ônibus, nunca mais essas coisas aconteciam”. Disse ela renunciando à sua maturidade de anciã. “Uma pedrada no motorista também faria ele ter mais respeito pela gente”. Completou.
Para ser sincero, não foi uma surpresa tão grande para mim, até porque também não estava feliz, visto que também precisei esperar na chuva. Sem entrar no mérito da agressividade, que convenhamos nunca seria posta em prática pela mulher, esse é um discurso presente nas mais diversas situações. No transporte público, no seu trabalho, nas relações familiares e claro, no futebol.
Tudo parece muito simples. “É só fazer isso.” “É só fazer aquilo.” Sinto que você, em algum momento, já falou dessa forma. E nem quero dizer que tudo no mundo é passível da solução mais complexa possível. O ponto não é esse. Mas a crença de que nós precisamos daquela coisa específica. É aquilo que vai nos salvar. A solução dos problemas. O fim das dificuldades. A bala de prata.
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Interessante que essa bala de prata vai mudando com o tempo. Não é algo fixo e imutável. Não me espantaria que na semana que vem a mesma senhorinha esteja pedindo uma alternativa diferente e somente esta alternativa poderia mudar aquilo que a deixou irritada. Quem sabe se a empresa de ônibus se tornasse uma SAF. O secretário de transporte está ultrapassado e precisamos imediatamente de um estrangeiro para comandar.
Em certo momento já foram os auxiliares nesta posição, sujeitos capazes com a sua jovialidade moderna, estudiosos. Já foram aqueles dinossauros que sabem como comandar um vestiário. Os sócios beneméritos é que conhecem o dia a dia do clube e são mais aptos para gerir o clube, não estes executivos que nada entendem de futebol.
Todo mundo pode escolher a narrativa que quiser. Só que o futebol dos heróis também precisa de vilões. Esses vilões já foram heróis, vão voltar a ser em algum momento. E as mudanças vão acontecendo, a roda vai girando. E o sentimento é que estamos no mesmo lugar. No ponto de ônibus sem cobertura. Tomando chuva.
Crônica de Pedro Heitor, de Los Futebólicos.