“O Futebol é o jogo mais complexo do mundo”. O autor desta frase é um dos grandes gênios metodológicos do século XXI, Paco Seirul·lo. Se o próprio criador do treino estruturado (metodologia espanhola que caminha junto com o jogo de posição) afirma que o Futebol é complexo, ora … não é simples resumir esta sua obra. O treino estruturado é embasado em uma forma de pensar e analisar o jogo diferente de todas as demais metodologias. Se, por um lado, temos a periodização tática com o treinador como ideólogo, no treino estruturado o treinador é uma figura de otimizador do jogar.
Aqui não se trata de fazer uma comparação entre as metodologias, mas sim chamar atenção para uma das diferenças marcantes entre ambas. A lógica do treino estruturado consiste em ver o jogador como o centro do processo; é ter a ideia de que cada jogador, melhorando individualmente, pode melhorar a equipe como um todo. Vamos por partes!
Quando estudamos o jogo de posição, é comum vermos que um dos pilares deste tipo de jogo se trata da obtenção de vantagens. Mas, afinal, que vantagens são estas? Vimos anteriormente que, se um jogador melhora individualmente, este aperfeiçoamento eleva o nível de jogabilidade da sua equipe e esta é uma das primeiras vantagens que se busca: a vantagem qualitativa! É ter jogadores que individualmente (e, por consequência, coletivamente) sejam melhores que o adversário.
Esta otimização se estrutura em 7 níveis: bioenergética condicional (comumente chamada de “preparação física”), coordenativa (ou também conhecida como “técnica”), cognitiva (interação com o processo e a sua resultante tomada de decisão), socioafetiva, afetivo-volitiva, expressivo-criativa e mental. Esses últimos quatro fatores se embasam pelos valores partilhados dentro de uma equipe bem como o bem-estar e o fortalecimento empático interno que impactam no jogador.
Além da qualitativa, temos as vantagens numéricas, posicionais, cinéticas e socioafetivas. Atenção! Todas e cada uma dessas vantagens não são passíveis de interpretações e/ou opiniões! Cada uma delas é muito bem especificada e depende única e exclusivamente dos fatos que o jogo traz!
A vantagem numérica significa que existem mais jogadores de uma equipe do que da outra em uma zona do campo; a vantagem posicional é quando os jogadores de uma equipe estão mais bem posicionados do que os jogadores da equipe adversária; a vantagem cinética indica que o(s) jogador(es) está(ao) em uma velocidade mais elevada que a do adversário ou que faz(em) a finta (sem bola, apenas com o corpo) para ganhar(em) campo em relação ao adversário; e, por fim, a vantagem socioafetiva se estabelece quando um grupo de jogadores tem uma relação tão forte (seja dentro ou fora de campo) que esta se sobrepõe às suas próprias individualidades, superando seus adversários (mesmo que individualmente se denote uma inferioridade qualitativa).
Para se ter controle sobre esta análise e saber quais vantagens se tem ou não, esta metodologia criou os espaços de fase e este tópico divide o campo em três zonas: de intervenção (onde os jogadores têm a possibilidade iminente de atuar naquele instante sobre a bola), de ajuda mútua (se destaca por ser o espaço em que os jogadores podem intervir em um espaço de tempo extremamente curto e com poucos ajustes) e de cooperação (espaço para além da ajuda mútua). Vemos abaixo os espaços e alguns exemplos das vantagens inerentes aos espaços:
Espaços de Fase
Exemplo de vantagens numéricas ofensivas
Exemplo de vantagens cinéticas ofensivas
Exemplo de vantagens posicionais defensivas
No que toca à periodização e à ciclização desta metodologia também há algumas diferenças em relação a outros métodos. O que devemos ter em mente é que no contexto espanhol há algumas características que fazem com que o treino estruturado seja único desde o vocabulário futebolístico até o planejamento semanal.
Desta forma, o jogo (assim como a periodização tática) é o determinante para obter indícios de como a semana irá se desenrolar. Vejamos exemplos de microciclos dentro deste método:
Jogo SÁBADO a DOMINGO
JOGO | Folga | +1 | Folga ou ED | Específico Dirigido (ED) | -3 | -2 | -1 | JOGO |
Jogo SÁBADO a SÁBADO
JOGO | Folga | +1 | Folga ou ED | -3 | -2 | -1 | JOGO |
Jogo DOMINGO a SÁBADO
JOGO | Folga | +1 | -3 | -2 | -1 | JOGO |
Jogo SÁBADO – QUINTA – DOMINGO
JOGO | +1 | -3 | -2 | -1 | JOGO | +1 | -1 | JOGO |
Jogo SÁBADO – QUARTA – DOMINGO
JOGO | +1 | -2 | -1 | JOGO | +1 | -2 | -1 | JOGO |
Jogo SÁBADO – QUARTA – SÁBADO
JOGO | +1 | -2 | -1 | JOGO | +1 | -1 | JOGO |
E o que significa cada um destes dias? A tabela abaixo explica.
TIPO DE TREINAMENTO | TRABALHO PRÉVIO | EXERCÍCIO INICIAL | EXERCÍCIOS CENTRAIS (1 OU 2 POR SESSÃO) | EXERCÍCIO FINAL | OBS. ADICIONAIS |
+1 | Ativação regenerativa | Passes (analítico) | Rondo | Regenerativo lúdico para os que jogaram mais. Jogo Reduzido para os demais. Jogadores com meia carga atuam como coringas neste exercício | Tempo total: 45 a 60 minutos |
Específico Dirigido | Ativação com prevenção de lesões | Passes ou Rondo | Jogo de Posição Pequeno e/ou Grande | Jogo de Situação ou Jogo Adaptado | Tempo Total: 90 minutos Carga cognitiva menor que no -3 |
-3 | Ativação com trabalhos de força 3D ou 4D | Passes ou Rondo | Jogo de Posição Pequeno e/ou Grande | Jogo de Situação ou Jogo Adaptado | Tempo Total: 90 minutos |
-2 | Ativação com prevenção de lesões | Rondo | Jogo de Posição Pequeno ou Jogo de Situação com diferente reinício | Jogo de Situação ou Jogo Adaptado | Tempo Total: 75 minutos |
-1 | Ativação com velocidade e agilidade | Rondo Socioafetivo ou Jogo Socioafetivo | Jogo de Situação com oposição limitada focados na finalização e Jogo de situação com diferente reinício | Jogo Reduzido | Tempo Total: 60 minutos |
Vemos que no treino estruturado há preocupação com a globalidade do futebol; provavelmente seja a única metodologia que vê o jogador de forma holística, desde a sua robustez de valores pessoais até o detalhe do jogo e que tipo de vantagens a equipe apresenta com maior frequência.
É claro que poderíamos entrar aqui neste resumo em assuntos como: 3º homem, exercícios (chamados de Situações Simuladoras Preferênciais – SSP), rondos, fases e subfases do jogo, características próprias de periodização e assim por diante; mas também precisamos entender que a complexidade pode “embaralhar as ideias” se o conteúdo não for bem claro. Quem sabe em um próximo momento?
Texto de Leonardo Monteiro
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