
Se existe uma verdade neste momento do futebol, é que os métodos de treino estão cada vez mais desenvolvidos e, paradoxalmente, cada vez mais parecidos. Podemos dizer que há, pelo menos, quatro escolas bem reconhecidas mundialmente no tocante à metodologia do treino e do jogo de futebol: portuguesa, espanhola, alemã e argentina.
Obviamente que não se quer desmerecer nenhuma outra federação formadora, mas estas quatro estão em maior evidência nos últimos 10 ou 20 anos. A sua abrangência tem sido tão grande que os olhos de todos os treinadores estão atentos às suas discussões metodológicas para não deixar passar nenhum detalhezinho sequer, pois todo e qualquer detalhe pode ser determinante para o resultado final.
Este nível de detalhamento do jogo é uma busca utópica para controlar o que é incontrolável, uma vez que a aleatoriedade do jogo sempre vai estar sobreposta a qualquer outro fator. Obviamente que o trabalho do treinador e de seu staff é diminuir – tanto quanto possível – os graus de imprevisibilidade e preparar a equipe o mais próximo possível do que já é esperado de se encontrar dentro das quatro linhas, mas ainda assim o antagonismo de duas equipes e suas tentativas de se impor no jogo fazem com que a atmosfera seja incerta.
No que se refere às questão táticas, há muitos anos a formatação das equipes se apoiava nos momentos ofensivos e defensivos. Alguns treinadores no Brasil até diziam que a organização era meramente defensiva, pois “o brasileiro sabe o que fazer com a bola”.
Hoje em dia, ainda que tenhamos esta visão em alguns casos, vemos que a nova geração de treinadores está muito equilibrada por saber que o estudo do jogo deve ser contínuo e, portanto, acaba, talvez, até passando do ponto, quando foca excessivamente em detalhes do jogo: o pé do jogador está assim, a posição corporal está de outra forma… e assim sucessivamente! Me arrisco a dizer que qualquer dia irão calcular a quantos graus norte a ponta do pé do jogador está voltada, se este extremo detalhamento continuar.
Fica aqui o questionamento: uma vez que o jogador que tem o poder de fazer a diferença diretamente no jogo, este tipo de informação extremamente detalhada poderia ser suficientemente conscientizada a ponto de fazer a diferença na fração de segundo da decisão do jogador? Cada um tem a sua resposta.
Falar de momentos ofensivos do futebol nos dias de hoje é um tanto quanto complexo. Para ajudar na compreensão deste momento do jogo, teremos que fazer um paralelo com o momento defensivo: “É mais fácil destruir do que construir”. Esta frase tem muito a ver com Futebol e também com outras áreas.
Na construção civil, quanto tempo se leva para construir uma casa? E quanto tempo se leva para demolir a mesma casa? Garanto que menos tempo e menos trabalho. No jiu-jitsu, por exemplo, a primeira aula é sobre defesa ou ataque? É muito mais fácil tirar a mão do adversário do teu próprio quimono do que colocá-lo em uma chave de braço. E por que isto acontece?
Quando queremos construir ou criar o trabalho é mais detalhado, não se pode fazer de qualquer forma! Há de se estudar as possibilidades, medir os riscos e ser certeiro desde o início até o final. Infelizmente (ou felizmente) não há atalhos!
Pense numa casa sendo construída, em um armlock do jiu-jitsu ou numa jogada ofensiva do futebol. Se fizermos de qualquer jeito, não passamos das primeiras etapas. A parede tem que estar perpendicular ao solo, o lutador adversário tem que estar com o braço vulnerável e o sistema defensivo adversário tem que estar posicionado de tal forma que os espaços deixados sejam aproveitados por nossa equipe.
Dito isto, o que podemos analisar em grande parte das ações ofensivas é que as equipes parecem ter entrado numa determinada “zona de conforto ofensiva”, ou seja, a bola tem que chegar próxima à área pela lateral e, a partir daí, se realiza um cruzamento. Isto é quase uma regra do século XXI, é o status que mais emergente do futebol de ataque. Observe as organizações e transições ofensivas, a grande maioria se trata deste tipo de movimento: avança com a bola, lado da área e cruza.
Não acredita? Trago aqui os seguintes dados da última Eurocopa (2024). Esta competição pode ser referenciada como sendo de elite de acordo com a qualidade individual e coletiva dos jogadores, além de ser a mais recente entre as seleções, junto com a Copa América.
A Euro 2024 teve um total de 51 jogos entre fase de grupos e mata-mata. Em 51 jogos, 1375 cruzamentos foram realizados em bola rolando* (média de 26,96 cruzamentos por jogo) e, destes 1375, apenas 292 foram pelo menos tocados pelo jogador atacante, ou seja, 1083 cruzamentos foram interceptados pelos adversários ou simplesmente foram diretamente para fora.
Isto significa que foi preciso uma média de 4,71 cruzamentos para que 1 fosse tocado por um jogador da equipe ofensiva. E pasmem: destes 1375 cruzamentos apenas 35 gols foram feitos. Isto significa que houve 0,69 gols por jogo provenientes de cruzamento. Imagine você que a cada jogo há mais de 25 cruzamentos dos quais não resulta em 1 gol sequer. Este dado mostra que a estratégia ofensiva de cruzar na área é igual ou inferior à aleatoriedade literalmente e o aproveitamento do tempo no momento ofensivo deve ser mais bem pensado. Deixo aqui a tabela dos cruzamentos de seleção por seleção:

*não foram contabilizados os cruzamentos oriundos de bolas paradas ou jogadas ensaiadas.
A perspectiva futura para um jogo de futebol ofensivo passa por trazer o espetáculo de volta, não mais fazendo ressonância com o status quo que se estabeleceu nos últimos tempos. Ou se mudam os tipos de cruzamentos (estudando especificamente o que tem dado mais certo ou não), ou se mudam os tipos de ataque (talvez mais por dentro). Caso contrário, os defensores agradecem as mesmas investidas ofensivas de sempre.
Texto de Leonardo Monteiro

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