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Foto: Rommel Romeiro

Oi, sou Rommell Romeiro e fui convidado a ser colunista do Foothub, convite que recebo com enorme alegria e responsabilidade. Ao longo da minha trajetória venho trabalhando diretamente com o desenvolvimento do futebol de base, especialmente na organização e acompanhamento de equipes brasileiras em torneios internacionais na Europa.

Foram dezenas de experiências que me permitiram observar de perto a diferença de estruturas, métodos de treino e mentalidade entre o futebol brasileiro e o europeu. Por isso escolhi começar minha participação aqui tratando justamente da importância do intercâmbio internacional para as categorias de base do Brasil, um passo fundamental para dar aos nossos jovens atletas a competitividade necessária diante de clubes que já figuram entre a elite mundial.

Durante muito tempo, os clubes e jogadores brasileiros foram protagonistas no futebol mundial, mas hoje é cada vez mais evidente a diferença técnica, tática, física e psicológica entre o jogador europeu e o restante do mundo. Atualmente, poucos brasileiros conseguem ser protagonistas em grandes clubes da Europa e nossas equipes enfrentam dificuldades quando encaram times europeus em competições intercontinentais. Afinal de contas, o que mudou de lá para cá? Foram os nossos jogadores que pioraram ou os europeus que melhoraram?

A verdade é que o futebol brasileiro se acomodou nos rótulos de “o único pentacampeão”, “terra de Pelé, Romário, Ronaldo e Ronaldinho” e nos feitos históricos de clubes lendários como o Santos de Pelé, o Botafogo de Garrincha, o Flamengo de Zico e o São Paulo de Telê. Enquanto isso, o futebol europeu não parou. Evoluiu com investimento em estrutura, capacitação de profissionais e, principalmente, na competitividade das categorias de base.

O Brasil segue revelando talentos, mas muitos deles, ao chegar à Europa, não se adaptam. Viram reservas, mudam constantemente de clube e não raramente retornam ao país. Os grandes clubes europeus entenderam isso e passaram a recrutar brasileiros cada vez mais jovens, oferecendo uma formação completa desde a base: física, técnica, tática, disciplinar e psicológica. Aqui, com frequência, os clubes ainda trabalham a base apenas como vitrine para negociações futuras. Existem boas estruturas e profissionais qualificados, mas a baixa competitividade durante grande parte do ano limita o desenvolvimento dos atletas.

Uma das formas mais eficientes de reduzir essa lacuna é justamente a participação em torneios internacionais, enfrentando equipes de alto nível. Esses torneios oferecem um ambiente que potencializa o desenvolvimento técnico, físico e psicológico dos jovens, além de proporcionar experiências valiosas também para as comissões técnicas. O passe, o domínio, a velocidade e a intensidade do jogo fora do Brasil são diferentes até mesmo quando duas equipes com grande investimento se enfrentam. Por isso, viver essas experiências não é apenas um desafio competitivo, mas também uma oportunidade de aprendizado coletivo.

Minha primeira experiência em um torneio internacional aconteceu em 2010, quando levei para a França uma equipe de menor expressão que havia sido vice-campeã goiana Sub-20. A diferença foi um choque imediato. Fiquei impressionado com a organização tática e a força física dos adversários, especialmente franceses e alemães. Naquele torneio estavam clubes como Zenit da Rússia, Hertha Berlin da Alemanha e Saint-Étienne da França, todos com um nível de preparo que contrastava fortemente com o que víamos no Brasil.

De lá para cá, voltei mais de cinquenta vezes ao continente europeu acompanhando times brasileiros em torneios de base. Essa vivência me permitiu observar a evolução contínua do futebol europeu, não apenas no aspecto físico e tático, mas também na qualidade técnica, no preparo mental e na educação dos atletas.

Na parte tática, a diferença é clara. Os jogadores europeus têm uma compreensão muito maior do jogo. Eles sabem onde precisam estar em cada momento e, principalmente, por que precisam estar ali. A obediência ao plano de jogo é visível durante os noventa minutos. Já no Brasil, é comum ver desorganização e quedas de concentração, atletas que não sabem para onde correr ou que não entendem a importância de ocupar determinado espaço.

Muitas vezes, falta transmitir aos jogadores parte do conhecimento que os treinadores estudam: aulas teóricas de tática, que na Europa já fazem parte da formação de base, ajudam a criar atletas mais conscientes e inteligentes em campo.

No aspecto físico, talvez seja a diferença mais perceptível. Contra franceses ou equipes do leste europeu, a força e a intensidade chamam atenção. Claro que há componentes genéticos e maturacionais que pesam, e por isso nunca gostei de colocar esse ponto como central. Para mim, a qualidade técnica é mais importante do que a força bruta. Mas o fato é que, desde cedo, os europeus trabalham com metodologias físicas que lhes dão vantagem em resistência, velocidade e intensidade de jogo.

Quando falo de qualidade técnica, esse foi um dos pontos que mais me marcou. O improviso e o drible latino ainda são diferenciais nossos, mas nos fundamentos básicos eles nos superam. Passe firme e preciso com as duas pernas, domínio orientado, jogo rápido em um ou dois toques. Tudo isso acelera a circulação da bola e torna o jogo mais coletivo e dinâmico. Lembro de um comparativo que me marcou muito: meu sobrinho treinava em Brasília e, como era comum, os coletivos viravam cenário para que cada menino tentasse driblar todos os adversários.

O treinador não corrigia, dizia que aquilo era “o futebol brasileiro”. Já em um treino de iniciação que observei na Europa, os meninos pareciam robôs, mas robôs muito bem treinados em fundamentos simples. Conversando com um amigo local, ele me disse uma frase que nunca esqueci: “Aqui as crianças aprendem desde cedo a compartilhar. O futebol é coletivo, por isso elas tocam a bola.”

Por fim, a parte emocional. Aqui temos um contraste interessante. Fora de campo, nossos jogadores costumam ser mais fortes: enfrentam mudanças de cidade, vida em alojamentos, adaptações de rotina e uma concorrência feroz desde cedo. Muitos jovens europeus não suportariam metade do que um garoto do interior do Nordeste enfrenta para se tornar jogador profissional em um clube do eixo Rio–São Paulo–Sul. Mas quando a bola rola, parece que esse peso se inverte.

Os europeus mantêm a frieza e a concentração, enquanto muitos dos nossos travam em momentos decisivos. Em todos esses anos, posso contar nos dedos os que exibiram uma personalidade diferenciada dentro de campo. Casos como Gabriel Moscardo, do Corinthians, eleito melhor jogador do FIFA Blue Stars, e Gustavo Gomes, do Athletico Paranaense, que brilhou em um torneio na França, mostram como essa mentalidade faz diferença.

Alguns clubes brasileiros ainda encaram a participação em torneios internacionais como despesa, enquanto outros já entenderam que se trata de investimento. Palmeiras, Flamengo, Fluminense e Athletico Paranaense participam com frequência desses torneios e, na maioria das vezes, vencem com autoridade. Não por acaso, são quatro dos clubes que mais revelam atletas e geram receita com suas categorias de base.

O exemplo recente do Flamengo ilustra bem essa discussão. O clube foi campeão mundial sub-20 ao vencer o Barcelona no Maracanã, escalando jogadores como Matheus Gonçalves. Mas fica a reflexão: e se o Barça tivesse descido Lamine Yamal, Pau Cubarsí e outros nomes que hoje já atuam entre os profissionais? O cenário poderia ter sido outro.

Com a globalização do futebol, assistimos a um fenômeno que há duas ou três décadas seria improvável: jogadores da Noruega, Suécia, Dinamarca ou até da Geórgia assumindo papéis de protagonistas em grandes ligas. Sem falar no talento crescente vindo da África, que cada vez mais ocupa espaço na elite europeia. A base do futebol mundial está mais diversificada, mais estruturada e mais competitiva.

Tive a oportunidade de assistir, por exemplo, a geração 2009 do Real Madrid em ação. A organização coletiva impressionava. Talvez, individualmente, os brasileiros ainda tenham mais talento bruto e capacidade técnica, mas a diferença é que os jovens europeus estão inseridos desde cedo em ambientes de alta exigência coletiva, onde fundamentos, intensidade e disciplina são inegociáveis. É nesse tipo de contexto que os nossos também precisam estar para evoluir.

Se quisermos que o Brasil volte a ter jogadores capazes de ser protagonistas em Copas do Mundo ou em confrontos intercontinentais contra os melhores da Europa, não basta apostar no talento natural. É preciso oferecer competitividade real desde a base. Se o objetivo dos clubes é vender atletas para o futebol europeu, antes de qualquer negociação precisamos garantir que esses atletas estejam preparados para competir de igual para igual, sem sentir o peso da diferença quando chegar a hora de enfrentar os europeus.

O futebol brasileiro não deixou de ter talento. O que falta é o ambiente ideal para que esse talento floresça em nível global. Torneios internacionais de base cumprem justamente esse papel: colocam nossos jovens frente a frente com a intensidade, a disciplina e a organização do futebol europeu, ao mesmo tempo em que valorizam nossas virtudes de improviso, técnica e resiliência. Essa mistura é fundamental para que possamos formar jogadores completos, prontos para brilhar tanto nos clubes da Europa quanto em nossas seleções de base e profissional. E isso começa na base, no chão, não no telhado.

Texto de Rommel Romeiro

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