O olhar da FIFA para as apostas esportivas

A Operação Penalidade Máxima, iniciada em fevereiro de 2023, trouxe à tona suspeitas que pairavam no mundo do futebol desde que os sites de apostas por cota fixa invadiram o mercado: a participação de atletas na alteração do funcionamento natural do jogo para provocar pênaltis, cartões amarelos, vermelhos, número de escanteios, ou, até mesmo, alterar o resultado final das partidas, com o objetivo de provocar e obter ganhos financeiros.

As notícias, os casos e os filmes sobre crimes, em regra, chamam a atenção das pessoas. Possuem uma espécie de “peso gravitacional” que atrai toda observação, a ponto de que outras questões fiquem à margem dos olhos da sociedade. Porém, a velocidade do direito e do processo penal, com exceção dos casos em que ocorrem acordos, é muito mais lenta em comparação com a possibilidade de imposição de sanções administrativas aplicadas por confederações ou ligas, cada vez mais preocupadas com o tema.

A preocupação, porém, não é nova. A FIFA há mais de uma década, pelo menos, cuida do tema. Ao mesmo tempo que reconhece que a indústria de apostas representa uma importante fonte de financiamento para Clubes e competições, preocupa-se com os riscos à integridade do futebol. Ela sabe que os benefícios financeiros não podem desfocar o olhar em relação à integridade do jogo, pois quando os torcedores deixarem de confiar na lisura dos resultados do campo, não haverá mais jogo.

Prova disso é a pena de banimento do esporte ratificada pela FIFA, a pedido da CBF, a partir de condenação no STJD, imposta aos atletas Gabriel Tota, Ygor Catatau e Matheus Gomes, além das suspensões temporárias entre 360 e 720 dias de outros oito atletas investigados na Operação brasileira.

A suspensão de Sandro Tonali

As mãos da FIFA não alcançam somente jogadores de competições menos importantes. Dia 27 de outubro, a entidade máxima do futebol anunciou que a punição de dez meses de suspensão aplicada ao meia Sandro Tonali, do Newcastle, pela Federação Italiana (FIGC), será válida para todo o mundo. Tonali foi suspenso por realizar apostas em jogos do Brescia e do Milan, quando atuava por essas duas equipes.

O prejuízo financeiro

É importante ter em mente que a punição traz reflexos no bolso dos atletas e dos clubes. O prejuízo do Newcastle e de Tonali não se dimensionam. Tonali transferiu-se para o Newcastle no último mês de julho, por 64 milhões de euros, a transação mais cara de um jogador de futebol italiano em todos os tempos. Agora, o clube se vê impossibilitado de escalar o atleta até o término da temporada 2023/2024. Tonali, titular da Seleção Italiana, também está fora das Eliminatórias da Euro e da própria Euro 2024, caso a Itália se classifique. Quais serão as perdas e desvalorização durante e após o período de afastamento forçado, além de todos os danos à imagem, não há como calcular.

Da mesma forma, é importante ressaltar que, apesar de estarmos falando de uma equipe da Premier League, aparentemente, a partir do que é noticiado, o Newcastle não tomou as cautelas necessárias quando da contratação de Tonali.

Na maioria das vezes, a análise de desempenho e de necessidade de contratação se limita aos aspectos verificáveis no campo de jogo. Porém, existem questões socioculturais e psicológicas importantes que devem ser levadas em consideração quando da avaliação de uma contratação, sejam para verificar se o Clube tem uma estrutura de apoio capaz de auxiliar o atleta a alcançar seu desempenho máximo, como para evitar prejuízos e escolhas que não tragam incremento de performance.

Da mesma forma, mesmo que não houvesse tempo para tal avaliação, digamos que pela urgência de fechamento de janela de transferências, cláusulas contratuais referentes a condutas contrárias às regras do jogo deveriam estar previstas para proteger o Newcastle, tanto em relação ao atleta, quanto em relação ao Milan, seu antigo clube. A avaliação de risco na contratação de atletas é fundamental para evitar ou minimizar prejuízos.

Leia: Casas de apostas e o seu impacto no futebol brasileiro

De: Matias Prata, Felipe Cirumbolo, Gaetano Grinberg e Walter Queiroz

Como a FIFA trata do tema

O Código de Ética da FIFA, em seu artigo 27, trata do envolvimento das pessoas que estão sujeitas a sua legislação com apostas, jogos de azar ou atividades similares. Da mesma forma, o artigo 30 trata da manipulação de jogos e competições.

De início, a FIFA proíbe a participação de árbitros, atletas e intermediários, inclusive, em apostas, loterias ou eventos similares ligados a partidas de futebol, com possibilidade se suspensão de até 3 anos do exercício de suas atividades, além de multa.

É importante ressaltar, aqui, que a previsão não se refere, necessariamente, a jogos nos quais, por exemplo, o jogador participe. A regra do item 1 do artigo 27, veda a realização em qualquer aposta ou similar relacionada com jogos, competições ou outras atividades relacionadas com o futebol:

“As pessoas vinculadas a este Código serão proibidas de participar, direta ou indiretamente, apostas, jogos de azar, loterias ou eventos similares ou transações relacionadas a jogos ou competições de futebol e/ou quaisquer atividades de futebol”.

No que diz respeito à “venda” de situações de jogo, o enquadramento não se dá na previsão do artigo 27, mas sim na figura do art. 30, referente à manipulação de jogos e competições, que remete ao Código Disciplinar da Fifa e que prevê sanção mínima de 5 anos de afastamento, podendo chegar ao banimento definitivo.

Manipulação e preocupação

A manipulação de jogos e competições, potencializada pela quantidade de dinheiro que move o mundo das apostas desportivas, catapultado e globalizado pelas plataformas digitais, está, hoje, no centro das preocupações das associações e confederações de futebol. Se no passado ouvia-se falar em suborno de atletas ou árbitros para beneficiar um clube em um determinado jogo, hoje, as possibilidades exponenciais de ganhos e capilarização de beneficiados impõem uma vigilância cada vez mais rígida de todos os players do futebol.

Tal preocupação deve se refletir em todos os players do mercado do futebol, uma vez que as possibilidades de perdas são incalculáveis, assim como os danos desportivos podem levar à perda de desempenho e performance.

As plataformas de apostas vieram para ficar, seja pelo dinheiro que investem em mídia, com comunicadores, redes sociais e empresas de comunicação, como pelo que dispendem em patrocínios de clubes de futebol e até mesmo de competições. Lutar contra as plataformas seria uma briga quixotesca e míope, diante do potencial de crescimento da qualidade das partidas, a partir do investimento, e do consequente giro em cadeia da economia desportiva.

Cabe a todos os envolvidos e aos órgãos de regulação atuarem na mesma direção, contínua e permanentemente atentos, no sentido de buscar meios de controle, construção e reforço de uma cultura que não transija com qualquer quebra de integridade no jogo de futebol. 

Texto de Felipe de Oliveira Mariana Gastal

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